Biden vai copiar a política anti-china dos republicanos. Quando os partidos concordam demais, pode ter certeza, quem se ferra é o povo.
O governo Biden anunciou que vai implantar medidas para reduzir drasticamente a isenção de impostos para importação de valores pequenos. É uma medida parecida com a que o Brasil tomou neste ano, na famosa taxação das blusinhas, que terminou com a isenção de impostos para produtos custando menos de 50 dólares. No Brasil, a medida foi tão impopular que gerou críticas até do porta-voz não oficial do governo, Felipe Neto. O YouTuber havia dito que era fake news o boato de que haveria a taxa, e quebrou a cara quando ela foi implementada. A medida foi o gatilho para a enxurrada de memes do Taxad, que pelo menos serviu para a gente rir no meio da desgraça.
No entanto, a medida nos Estados Unidos tem um caráter bem diferente do Brasil. Lá, a isenção é para produtos de até 800 dólares, e contempla uma grande quantidade de produtos. Estima-se que mais de um bilhão de pacotes dessa faixa tenham entrado no país no ano de 2023. Essa quantidade era quase dez vezes menor do que há dez anos, mas teve grande crescimento devido ao vertiginoso aumento de exportações chinesas. Os populares Apps de comprinhas como a Shein e a Tamu certamente contribuíram nesse crescimento.
Outro fator que impacta a questão é a tensão geopolítica. Estados Unidos e China já vem trocando farpas há bastante tempo, e muita gente no país norte-americano está receosa com a crescente dependência da economia americana sobre empresas chinesas. Inclusive, esta é uma das principais bandeiras dos republicanos e de Donald Trump, o que torna a questão curiosa. Lembre que estamos em período de campanha eleitoral. Será que os democratas estão tentando capturar alguns eleitores do outro lado?
Uma coisa é certa, quando políticos concordam demais, desconfie. Políticas de aumento de impostos costumam ser bem recebidas nos dois espectros políticos, já que no fim das contas é dinheiro entrando no bolso desses parasitas. É claro que o governo não vai assumir que quer se dar bem em cima do povo, então ele cria uma série de desculpas para justificar tais atos. Tudo é, supostamente, para o bem da população. Crises geopolíticas se encaixam como uma luva no interesse dos políticos, afinal, em momentos de crise há mais espaço para aumentar o abuso sobre a liberdade da população.
Uma desculpa esfarrapada é que o governo estaria protegendo a indústria americana e gerando empregos. Esta é a mesma ladainha que o governo brasileiro usou. A ideia de protecionismo já foi refutada pela escola austríaca de economia há décadas, mas os Estados nacionais continuam insistindo nessas ideias ultrapassadas. Num primeiro momento, de fato as indústrias do país ganham competitividade. No entanto, as barreiras de importação também aumentam o custo de bens de consumo que as próprias indústrias usam, o que no longo prazo reduz sua competitividade. O Conselho da Indústria de Tecnologia da Informação dos Estados Unidos percebeu essa questão e ressaltou: "as tarifas adicionais em chips e outros eletrônicos vão causar disrupção e instabilidade em toda a cadeia global de fornecimento". Desta forma, os produtores americanos que compram de fornecedores chineses vão se tornar menos competitivos no mercado mundial.
Fora a questão das indústrias e empregos, a medida cria um sério risco para os políticos. Os americanos já estão amargando alta inflação para seus padrões. A nova taxação tende a aumentar mais ainda o preço de diversos produtos, consumidos pela população. Por mais que boa parte do eleitorado tenha medo da tensão geopolítica e não queira se sentir dependente dos chineses, quando a medida dói no bolso, a opinião muda. É provável que o aumento do custo de vida leve o povo a criticar seus governantes, com razão.
Outra desculpa esfarrapada que os políticos estão dando é que, supostamente, a nova taxa vai facilitar a fiscalização de produtos. Então a população estaria sendo protegida de produtos falsificados, de má qualidade, ou até de substâncias perigosas como o fentanil . Eles só não perceberam que agora a alfândega vai ter que inspecionar bilhões de produtos a mais. É capaz que isso reduza a qualidade da inspeção dos produtos em geral. De qualquer forma, está na cara que esta justificativa não passa de balela. Primeiro, que o consumidor já tem meios de trocar produtos de má qualidade sem precisar da ajuda do governo. Segundo que produtos ilegais como drogas ou falsificações, que nem deveriam ser ilegais em primeiro lugar, já entram de qualquer jeito no país e vão continuar entrando. O proibicionismo acaba apenas beneficiando o mercado negro e aumentando o custo da mercadoria proibida, além disso, não precisamos de engenheiros sociais dizendo o que podemos consumir ou não.
O professor da universidade de Yale, Amit Khandelwal, percebeu outra questão nefasta da medida. Ela vai recair desproporcionalmente sobre os mais pobres. Pois sua pesquisa mostrou que esta parcela da população compra mais produtos chineses do que as parcelas mais altas. Aqui no Brasil nós podemos perceber isso também. Os Apps como Shein e Shoppe permitiram que muita gente de baixa renda tivesse acesso a uma enorme gama de produtos a preço baixo. Mas você acha que quando o governo diz que vai defender os pobres ele fala a verdade? É só reparar nas suas políticas e constatar que o orçamento dos políticos é uma prioridade muito maior que a melhoria de vida dos pobres.
Outro setor que sentiu muito no Brasil e provavelmente também vai sentir lá nos Estados Unidos é do pessoal que tem algum hobby específico. Por exemplo, fãs de anime compram fantasias de personagens, ou colecionam bonecos que não são produzidos no país. Então essas pessoas ficam sem alternativa, a não ser pagar valores exorbitantemente caros, ou serem privados de seus hobbies. O mesmo vale para praticantes de esportes que utilizam certo tipo de equipamento ou qualquer outro tipo de consumo específico, que não tem alternativa de compra no mercado interno.
Repare como as tensões geopolíticas ajudam os estados a colocar em prática suas políticas mais nefastas. Desde sempre foi assim. Durante a 1ª guerra mundial, os governos da Inglaterra e da Alemanha imprimiram quantidades colossais de dinheiro para investir em poderio militar. Obviamente, a inflação da moeda gerou aumento de preços, o que serviu de desculpa para ainda mais intervencionismo, como controle de preços e racionamento de produtos.
Mas não é só na economia que o estado mete a mão. Ele também avança sobre outras liberdades, como a privacidade. Por exemplo, após os atentados de 11 de setembro de 2001, o governo americano, através da NSA, passou a espionar a própria população e a de outros países, sem consentimento. Ele montou um sofisticado sistema de monitoramento da internet, conseguindo até acessar a webcam de algumas pessoas. Supostamente o objetivo era evitar o terrorismo. Mas não é à toa que existe lei de sigilo de meios de comunicação em qualquer país supostamente civilizado. É uma medida que impede que funcionários do governo ou políticos abusem de seu poder para fins pessoais, ou de perseguição política. Agora no Brasil tivemos um grande retrocesso nesse sentido, com o fim do sigilo bancário. Mas este assunto é para outro vídeo.
Portanto, não há nada de novo ao sol. Os dois lados do jogo político americano estão usando a questão geopolítica para atacar a liberdade de sua população. Já sabemos que isso só vai atrasar a economia dos Estados Unidos e também do resto do mundo. Todos os países compram produtos americanos e o comércio internacional é feito em dólar. Se a economia americana vai mal, o mundo inteiro sente os seus efeitos.
A prosperidade e a paz mundial dependem do livre comércio. O cidadão americano quer comprar produtos, o cidadão chinês quer vender. O que eles têm a ver com as picuínhas de seus governantes? No final, os líderes dos países se abraçam, pois o conflito é benéfico para quem está no poder. Mas o povo, que sente na pele a insegurança e a privação, acaba tendo que pagar o pato. Sabemos que as medidas protecionistas vão prejudicar a população, assim como foi em todas as centenas de vezes que isso se repetiu ao longo da história. Parabéns aos democratas, que escolheram uma das piores políticas dos republicanos para copiar.
https://exame.com/mundo/governo-biden-vai-taxar-compras-em-sites-chineses-como-shein-e-temu/
https://en.wikipedia.org/wiki/2010s_global_surveillance_disclosures
https://mises.org.br/livros/76/as-seis-licoes