Godzilla nos mostra que a guerra é o alimento do estado

A rica história original do monstro radioativo é agora retomada e ampliada, tratando-se de muito mais do que foi mostrado nos filmes anteriores.

Em dezembro de 2023 foi lançado um novo filme sobre Godzilla, o famoso dinossauro mutante e radioativo que, vira e mexe, ataca cidades costeiras no Japão.

Inclusive, já falamos sobre o sucesso que este filme vem alcançando, o qual contrasta com os fracassos da indústria cinematográfica neste ano, no vídeo 'Godzilla ESMAGA a DISNEY nos CINEMAS: será o fim dos grandes estúdios?' O link está na descrição.


Godzilla talvez seja a primeira obra cinematográfica que logo virou série. Há muitos filmes lançados pela indústria japonesa e mesmo por Hollywood, os quais abandonam a temática original, transformando-se meramente em brigas épicas de monstros gigantes. Mas, no fundo, o grande mérito deste último filme é retomar o assunto que começou a ser tratado no seu âmago pelo original de 1954. Por isso vamos analisar a genial criação de Shigeru Kayama, adaptada ao cinema por Takeo Murata e brilhantemente dirigida por Ishirõ Honda e, no final, traçar um paralelo com Minus One.


Mas antes de tudo temos que imaginar o que era o Japão no pós-Segunda Guerra Mundial. O país estava absolutamente falido, várias cidades estavam destruídas, o mito da invencibilidade do imperador se esfacelou, Hiroshima e Nagasaki, duas cidades enormes, nem existiam mais. E claro, a moral do povo nunca esteve tão baixa e a situação nunca foi tão difícil.


E é nessa situação que, mais uma vez, acontece o fenômeno que tanto alardeamos aqui no Visão Libertária. Nesse ambiente onde tudo desaba, resta apenas o indivíduo! E foram essas pessoas que, apesar de toda a situação decadente que os rodeava, uniram-se, lutaram e, como sabemos, venceram.


No entanto, uma das primeiras mudanças no pensamento do indivíduo japonês, que antes confiava tudo na pessoa do imperador, passa agora a confiar na força do indivíduo e na sua associação livre e voluntária. Só essa força, que nasce de baixo para cima, é capaz de construir uma nação!


A geração japonesa do pós-guerra ficou marcada pela desconfiança com o ente estatal. Muitos se questionavam quais teriam sido os próprios erros que o imperador cometeu para atrair uma guerra acéfala e que não lhes pertencia, para dentro do Japão. E, após ter atraído os horrores da guerra para o cidadão comum, o imperador já não estava lá para ajudar depois que o pior aconteceu. Alguém aqui surpreso com essa atitude das máfias estatais?


Mas vale a pena lembrar de novo que, a mera ideia de contestar qualquer decisão do imperador era tido como um crime grave dentro do Japão Imperial, que poderia até ser punida com a morte. Por outro lado, é justamente o que se torna senso comum no pós-guerra.


É importante compreender bem isso, pois o cinema ocidental muitas vezes tenta glamorizar as guerras e a atuação heroica dos soldados. Mas que aqui ninguém se engane! Morrer na guerra não é bravura, não há honra nisso, exceto se tiver sido a única maneira de proteger inocentes e verdadeiros agressores. Morrer na guerra, para a causa do estado e sua elite, é só morrer sem sentido. A guerra é o pior momento da vida humana, é a realização mais bestial, é o extremo da violência e da agressão, exatamente o inverso do PNA, o princípio de não-agressão libertário.


Infelizmente, o mundo é cruel e há situações em que a guerra bate à sua porta. Quando não dá para fugir, então só resta sobreviver. E ainda no fim da guerra, além da destruição, restam os equipamentos de destruição. O que fazer com uma metralhadora se não há guerra, mas há milhares de bocas a alimentar? É no pós-guerra que a guerra se mostra ainda mais cruel, inútil e sem sentido.


O problema é que os estados e seus governantes se alimentam de guerras. Nem havia acabado a Segunda Guerra Mundial e o Japão já se via pressionado pela guerra fria, na iminência de sofrer outro ataque nuclear, seja de soviéticos, seja de americanos.


E, por melhor que fossem as inclinações do imperador, pela teoria do cálculo econômico de Hayek, sabemos que é impossível realizar planejamentos de grande escala de forma centralizada com um mínimo de eficiência. Mas quem disse que as inclinações do imperador eram as melhores? Imperadores, ou qualquer tipo de governante que tenha poder em suas mãos, tende inevitavelmente a tomar ações que aumentem seu poder, seja conquistando novos territórios, subjugando inimigos políticos, e no limite, oprimindo sua própria população.


Veja, obviamente, não é isso que desejamos! Alguns defendem a ideia de Reis Filósofos como desejava Platão, no entanto, infelizmente os incentivos e a natureza humana jogam contra o ideal platônico, e a história não nos deixa mentir.


No entanto, há que se reconhecer que monarquias reúnem melhores incentivos para forjar bons governantes do que a democracia, e também é o que vemos ao longo da história. O problema é que, segundo Aristóteles, a monarquia é o regime mais fácil de se transformar em tirania, dependendo tão somente do caráter do governante.


Nessa linha fina e quase invisível é que se equilibram as sociedades humanas há pelo menos 5.000 anos. Todos nós sabemos que o libertarianismo e o anarcocapitalismo não entregarão o paraíso na Terra, ninguém aqui está defendendo um materialismo histórico e uma promessa utópica. Até porque, no final das contas, a organização social que realmente importa é a cidade de Deus, transcendental como descrita por Santo Agostinho. Todas as civilizações humanas experimentam ciclos de criação, desenvolvimento, ápice e a corrupção gerando decadência. Bem, sorte de quem viveu numa civilização em seu ápice, porque desde há uns 200 anos só se vê degeneração por aqui no ocidente.


Mas voltemos ao nosso querido monstro. E agora damos o aviso de spoiler. Se preferir, veja primeiro ambas obras-primas do cinema e depois volte para conhecer o resto de nossa visão libertária sobre o tema.



A estreia do Godzilla, tanto no clássico de 1954 quanto em Minus One, relembra o incidente com o Fukuryu Maru. Se trata de uma embarcação japonesa de pesca, quando 23 marinheiros foram afetados pela radiação durante a detonação experimental de uma bomba de hidrogênio pelos americanos.

Fica claro então que Godzilla representa justamente a guerra em si e o rastro de destruição que ela traz consigo.


No clássico de 1954, ao retratar Godzilla, o diretor deixa claro que a guerra surge sem explicação e destrói tudo o que há pela frente de maneira ininteligível. É como se a destruição se justificasse pela própria destruição e a morte se justificasse pela desvalorização da vida.


É um culto à insanidade, uma ode ao ódio e uma prece por vingança, que traz o que há de pior de dentro do ser humano.


Ao longo da trama se percebe como o ente estatal age de maneira anti-humana, desejando apenas a destruição do monstro, independente dos recursos humanos e materiais a serem despendidos para tal. Isso contrasta com a visão do paleontólogo, o Dr. Kyõhei Yamane, que deseja estudar o monstro e compreendê-lo.
No entanto, as súplicas do cientista são sufocadas pela explosão das bombas que o estado, com seus militares bem preparados, lançam em direção ao ser indesejado.


Mas apesar de todos os esforços empreendidos pelos militares japoneses, nenhuma bomba, nenhum canhão, nenhum míssil parecem surtir efeito contra o monstro. Então, é nesse ambiente de destruição e desesperança, que surge mais uma vez o indivíduo com sua inventividade única para resolver problemas. E também fica clara a mensagem de que guerra não termina com mais guerra. Guerras terminam com inteligência e esforço individual, guerras terminam com um sentido de construção e proteção, e não com mais destruição.


Assim, no clássico de 1954, o professor Serizawa, que estudava reações de oxigênio dentro da água, acaba descobrindo uma maneira de eliminar o oxigênio da água, que resulta na destruição de qualquer organismo que esteja ali. É a famosa bomba de oxigênio, uma clara alusão a armas de destruição em massa, exatamente como a bomba atômica.


Mas que, ao contrário dos mafiosos americanos, esse honrado cientista só permite o uso desse equipamento mortífero se ele próprio puder operá-lo. Com essa desculpa, Serizawa mergulha com sua máquina de morte e sacrifica a si próprio para deter Godzilla.


É o contraste infame entre a guerra sem rosto, sem propósito e sem fim, causada por estados autoritários, e a atitude heroica de um indivíduo que mantém firme seu propósito e seu caráter.


Já em Minus One, o último da série, nem a bomba de oxigênio é suficiente para deter o monstro, que só é vencido quando começam a utilizar barcos rebocadores e de pesca. Assim, fica claro que para vencer o monstro não basta equipamentos de destruição e nem sacrifícios humanos. O que detém os horrores da guerra é a união das pessoas em torno de ideais em comum. Essa mensagem é simplesmente genial!


E é assim que toda a guerra termina: com a evidente falência do estado e seus planos centralizados, massacrada pelo caráter dos indivíduos.


Para continuar nesse assunto, confira agora a história verídica da guerra de um indivíduo chamado Marvin John Heemeyer contra o estado, no vídeo 'Homem constrói um tanque de guerra para atropelar o Estado', com o link na descrição

Referências:

Godzilla ESMAGA a DISNEY nos CINEMAS: será o fim dos grandes estúdios?
https://www.youtube.com/watch?v=maQxUc9PQbU

Homem constrói um tanque de guerra para atropelar o Estado
https://www.youtube.com/watch?v=LEscHi5TjW0