A The Economist elogia o STF e chama censura de “maturidade democrática”. Mas será mesmo progresso quando juízes não eleitos decidem quem pode falar e disputar eleições?
A capa da revista britânica The Economist desta semana trouxe o rosto do ex-presidente, Jair Bolsonaro, pintado com as cores do Brasil e um chapéu de chifres, numa clara referência ao “xamã do Capitólio”, figura da invasão ao Congresso americano em janeiro de 2021. A mensagem não deixa dúvidas: Bolsonaro é retratado como o “Trump dos trópicos” e, mais do que isso, como um perigo para a democracia brasileira.
Não é a primeira vez que a The Economist tenta influenciar diretamente o debate político brasileiro. Em 2009, por exemplo, estampou na capa o Cristo Redentor decolando como um foguete, celebrando o “milagre econômico” da era Lula. Anos depois, o mesmo Cristo aparecia despencando dos céus, simbolizando a crise que se seguiu. Agora, ao escolher Bolsonaro como alvo, a revista mantém o padrão: sempre há uma narrativa simplista, ilustrada por metáforas de impacto, que busca moldar a percepção internacional sobre o Brasil.
No editorial, porém, a revista vai além da caricatura. Afirma que o julgamento de Bolsonaro, por supostamente liderar uma tentativa de golpe, seria prova de que o Brasil alcançou uma “maturidade democrática”, capaz de dar lições até mesmo aos Estados Unidos. Segundo o texto, enquanto os americanos se mostram incapazes de lidar com Trump, o Brasil estaria punindo Bolsonaro de maneira exemplar, deixando para trás sua “fase populista” e demonstrando responsabilidade institucional.
À primeira vista, parece um elogio. Afinal, quem não gostaria de ver seu país sendo tratado como exemplo de maturidade? Mas basta olhar com mais atenção para perceber o absurdo: o que a The Economist chama de maturidade nada mais é do que perseguição política aberta, conduzida por um Supremo Tribunal Federal que atua como vítima, investigador, acusador e juiz ao mesmo tempo.
Essa inversão não é casual. A mídia internacional frequentemente ecoa a versão oficial das elites progressistas locais. O mesmo se viu na Venezuela, quando jornais estrangeiros, durante os primeiros anos de Chávez, chamavam suas medidas autoritárias de “ousadia democrática”. O paralelo é claro: quando a perseguição atinge adversários de esquerda, a mesma imprensa clama por direitos humanos; quando atinge conservadores ou liberais, vira “defesa das instituições”.
O julgamento em questão, previsto para começar em 2 de setembro, acusa Bolsonaro de nada menos do que cinco crimes: tentativa de golpe de estado, tentativa de abolir violentamente o estado de direito, liderar organização criminosa, dano ao patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado. A acusação se apoia no contexto dos eventos de 8 de janeiro de 2023, quando apoiadores invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes em Brasília. Bolsonaro nega todas as acusações. Seus críticos, contudo, afirmam que ele teria incentivado o movimento e até organizado um plano para impedir a posse de Lula. Segundo a The Economist, esse plano teria “fracassado por incompetência, não por falta de intenção”. E, segundo a própria revista, “seus aliados provavelmente serão considerados culpados” pelo STF.
Note a ironia: um veículo que deveria prezar por jornalismo sério já antecipa a condenação antes mesmo do início do julgamento. A mensagem é clara: o importante não é o devido processo legal, mas o resultado político conveniente.
É curioso observar que, em democracias maduras de fato, a imprensa zela pelo contraditório. Nos Estados Unidos, mesmo veículos abertamente hostis a Trump reconhecem que cabe ao júri e aos tribunais avaliar sua responsabilidade. Já no Brasil, a condenação é tratada como favas contadas antes mesmo que os autos sejam analisados. Isso não é jornalismo: é ativismo político transnacional.
Boa parte do editorial se dedica a comparar Bolsonaro com Trump. Ambos, segundo a revista, teriam contestado derrotas eleitorais, espalhado “mentiras” sobre fraude e inspirado invasões a sedes de governo. Mas enquanto Trump voltou à Casa Branca após derrotar Kamala Harris, Bolsonaro estaria sendo exemplarmente punido.
E aqui está o contraste: nos EUA, apesar de todo o pânico midiático sobre o “golpe de 6 de janeiro”, Trump não foi condenado por sedição. A Suprema Corte reconheceu imunidade a ex-presidentes por atos oficiais. Ele pôde disputar eleições, venceu e voltou ao poder. No Brasil, por outro lado, Bolsonaro foi declarado inelegível pelo TSE por uma reunião com embaixadores, sem direito de defesa ampla.
Ou seja: o que a The Economist enxerga como “imaturidade” nos EUA é, na verdade, respeito a princípios básicos de devido processo legal e liberdade política. E o que ela celebra como “maturidade” no Brasil é justamente o oposto: uma corte que persegue adversários, cria inquéritos de ofício, concentra poder e cala qualquer voz dissonante.
Ademais, a "The EComunist" descreve o STF como “guardião da democracia brasileira”. Reconhece que os ministros acumulam funções demais, mas ainda assim os elogia como protagonistas na defesa das instituições.
Só que aqui está o detalhe incômodo: os ministros são juízes não eleitos, que assumiram para si o papel de censores oficiais do debate público. O chamado “Inquérito das Fake News” é o exemplo mais escandaloso: aberto pelo próprio tribunal, investiga, acusa e julga. Jornalistas foram presos, contas em redes sociais foram bloqueadas, veículos de mídia independentes foram desmonetizados e até parlamentares eleitos tiveram suas vozes silenciadas.
O caso do deputado Daniel Silveira é emblemático: preso por palavras, condenado por “atos antidemocráticos” e mantido sob monitoramento mesmo após receber indulto presidencial. Outro exemplo é o de influenciadores e jornalistas que tiveram contas bancárias congeladas e redes sociais censuradas sem ordem de instância inferior. Esses precedentes criam um ambiente de medo em que a autocensura se torna regra.
Tudo isso sem base legal clara, sem respeito a instâncias, sem contraditório. Se isso é “guardar a democracia”, o que seria rasgá-la?
Contudo, o que mais impressiona é como a mídia internacional engole e reproduz essa versão sem questionar. Para veículos como a The Economist, não importa se direitos individuais são violados. O que importa é que o inimigo político — Bolsonaro, no caso — seja derrotado. Aplaudem a censura como se fosse um exercício de responsabilidade.
Isso revela um padrão: a mídia global compartilha os mesmos pressupostos ideológicos da esquerda brasileira. Quando o STF silencia opositores, não é censura; é defesa da democracia. Quando o governo Lula expande gastos, não é irresponsabilidade; é inclusão social. Quando sindicatos param o país, não é sabotagem; é luta legítima.
É a mesma inversão de sempre: o poder estatal é tratado como solução, mesmo quando age como máfia.
Do ponto de vista libertário, o editorial da The Economist é didático. Ele mostra como o conceito de democracia é manipulado para justificar abusos de poder. Chamar censura de maturidade democrática é como chamar extorsão de solidariedade: uma mentira conveniente para legitimar a coerção.
E esse é justamente o perigo: a normalização da censura. Quando ela se torna aplaudida por veículos internacionais de prestígio, o recado aos governantes é simples — podem avançar ainda mais contra a liberdade, pois contarão com aplausos, não críticas. Esse círculo vicioso enfraquece qualquer possibilidade de resistência institucional.
Na prática, o que temos é um estado cada vez mais centralizador, que não aceita oposição real. Bolsonaro é apenas o alvo da vez. Amanhã será qualquer jornalista, ativista ou cidadão comum que ousar discordar da narrativa oficial.
Aplaudir isso como exemplo de civilização é fechar os olhos para a essência da liberdade. Pois a verdadeira maturidade não está em obedecer sem questionar, mas em respeitar a pluralidade, a liberdade de expressão e o direito de cada indivíduo de escolher seu próprio caminho.
Portanto, o que a The Economist celebra como avanço é, na verdade, o avanço da tirania. É o triunfo da ideia de que juízes iluminados podem salvar a nação, mesmo que para isso precisem calar milhões.
O editorial da The Economist termina dizendo que o Brasil, “ao menos temporariamente, se tornou o adulto democrático do hemisfério”. Mas o que realmente aconteceu foi o contrário: o Brasil aceitou a tutela de um Supremo hipertrofiado e de um governo que não hesita em usar censura como arma.
De adulto, o Brasil só tem a pose. Na prática, se comporta como um adolescente inseguro que entrega suas liberdades em troca da aprovação de um “pai” estrangeiro. Esse paternalismo internacional é insultuoso: trata os brasileiros como incapazes de decidir por si mesmos e reforça a dependência da chancela midiática global.
Se há uma lição aqui, não é de maturidade, mas de servidão voluntária. O povo aceitou trocar liberdade por promessas de estabilidade. Aceitou que o estado decida o que pode ou não ser dito, quem pode ou não disputar eleições. Aceitou que a "democracia" seja definida pelo humor de onze ministros, que têm mandato vitalício e sequer são eleitos.
A The Economist pode até achar isso bonito. Nós, libertários, sabemos que não há nada mais infantil do que acreditar que pode haver liberdade sob as botas de censores togados.
https://www.estadao.com.br/politica/the-economist-capa-jair-bolsonaro-viking-do-capitolio-veja-nprp/
https://www.terra.com.br/noticias/brasil/politica/com-bolsonaro-na-capa-the-economist-diz-que-brasil-da-licao-de-maturidade-democratica-aos-estados-unidos,acbba94352502f6cf9dcfc767f6f6feai8odm5k3.html