Secretaria de Segurança do AMAZONAS abre licitação para comprar PlayStation 5

É pra isso que serve o estado: para comprar PlayStation 5 para os funcionários públicos!

O caso seria bizarro se não tivesse acontecido aqui no Brasil. A Secretaria de Segurança do Amazonas iria realizar uma licitação, no próximo dia 7, para adquirir diversos itens que fazem parte de seu “programa de qualidade de vida no trabalho”. Dentre os diversos produtos listados, alguns chamaram bastante a atenção. Destacam-se itens como puffs, poltronas massageadoras, máquinas de café sofisticadas, mesas de pingue-pongue, cadeiras giratórias e até mesmo 18 televisores. Mas o maior destaque ficou mesmo para o pedido de 18 unidades do videogame PlayStation 5, que consta na citada licitação.

Pois é: você precisaria desembolsar mais de 4 pilas para comprar uma unidade desse console; mas ele estava lá, na cotação de preços da Secretaria de Segurança. Ou melhor, as 18 unidades do PS5 estavam lá, para não deixar dúvida. Aliás, não se trata apenas da compra dos aparelhos: estava prevista, também, a aquisição de um plano de assinatura com validade de 5 anos para download de jogos - cujos valores se situam entre R$ 278 e R$ 548 ao ano. A licitação, por óbvio, não citava nominalmente o console, mas as características descritas no documento não deixam dúvida: trata-se do PS5 mesmo.

A licitação foi autorizada pelo coronel da Polícia Militar Anézio Brito de Paiva, que é secretário-executivo da pasta. Na justificativa da licitação, encontramos os seguintes argumentos: as compras teriam o objetivo de “promover iniciativas voltadas a melhorias nos respectivos ambientes de trabalho, a saúde e melhoria da qualidade dos ambientes de trabalho dos servidores do órgão”. Bela explicação, você não acha?

A Secretaria de Segurança também tratou de se explicar. Segundo a nota oficial, emitida pelo órgão: a licitação teria por objetivo “promover um ambiente de trabalho saudável, auxiliando na manutenção da saúde mental de homens e mulheres que compõem o sistema, uma vez que a atividade policial é uma das mais estressantes do mundo”. Além do mais, de acordo com a secretaria, a grana para as aquisições foi destinada pelo Fundo Nacional de Segurança Pública ao Fundo Estadual equivalente e, portanto, não poderia ser gasta de outra forma. Isso, supostamente, faz parte do projeto Qualidade de Vida no Trabalho do Governo Federal. Vai vendo.

Segundo outro coronel da polícia amazonense, também ligado à secretaria, os itens a serem adquiridos ficariam em uma sala do Centro Integrado de Comando e Controle. Esse local é destinado ao monitoramento de vários pontos do estado, e também para reuniões da secretaria e do governo estadual. Parece realmente um ambiente adequado para instalação de videogames e cadeiras de massagem, não é mesmo? De qualquer forma, dada a repercussão negativa, a Secretaria de Segurança do Amazonas resolveu cancelar, pelo menos por enquanto, a tal licitação. Que decepção!

Bem, vamos ao grande ponto: quando você pensa em gasto estatal com segurança, o que lhe vem à mente são mesas de pingue-pongue e consoles de videogame de última geração? Não seria melhor gastar essa grana com armas, equipamentos para a polícia, sistemas de inteligência mais sofisticados, treinamento de combate e coisas mais efetivas?

É claro que alguém poderia argumentar: “os policiais precisam mesmo relaxar!”. Ok, eu concordo. Mas precisava ser com coisas tão caras assim? Como mensurar o correto equilíbrio, o custo-benefício entre tais aquisições e seu resultado prático, no desempenho das funções dos policiais? Pois é, isso é impossível - e essa é a grande questão. Não existe forma eficiente de concluir se esse gasto faz ou não sentido, ou se ele se reverte ou não em benefício para a população.

O fato, contudo, é que o estado do Amazonas, certamente, tem muitas prioridades mais urgentes na segurança pública. Afinal de contas, estamos falando do terceiro estado mais violento do país. De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, inclusive, a média de homicídios no estado é de 38,8 a cada 100 mil habitantes - quase duas vezes maior que a média do Brasil. A sua capital, Manaus, é a 23º cidade mais violenta do país. Ou seja: há muito trabalho sério a ser feito no Amazonas.

É aí que se revelam, então, os famosos clichês do funcionalismo público. “Tem que aumentar o salário dos funcionários públicos, para que eles trabalhem melhor!” “Tem que dar benefícios para que eles fiquem mais motivados!” “Tem que comprar PlayStation para que os policiais fiquem mais relaxados!”. Se, por um lado, na iniciativa privada o trabalho vem antes da recompensa, parece que, no serviço público, a coisa funciona ao contrário…

Esse caso também nos ajuda a perceber qual é a grande perversão do orçamento público. Existem gastos globais, que estão relacionados a grandes áreas da atuação do estado. Por exemplo: gastos com saúde, educação, segurança, infraestrutura, etc. Quando um político fala sobre os “investimentos” nessas áreas, ele fala da coisa de forma global mesmo: um aumento de R$ 10 bilhões na verba da saúde, mais R$ 500 milhões na educação, etc. O problema é que, dentro dessas áreas, existem vários gastos menores, mais específicos e - na maior parte dos casos - completamente aleatórios.

É por isso que, ao destinar uma grana preta para a segurança, parte desses valores vai acabar sendo direcionada para a compra de videogames. Esse valor específico está dentro do bolo que é apresentado pelo político como sendo “investimento na segurança”. Só que, no fim das contas, isso não representa qualquer resultado prático no combate à criminalidade. E como esse caso não é isolado, podemos concluir que grande parte do orçamento público - se não a maior parte - acaba sendo direcionada para elementos acessórios. Em outras palavras, é desperdiçado mesmo.

Afinal de contas, você acha que o gasto com a saúde pública realmente vai para hospitais, ou então para pagar os salários de médicos e enfermeiros, e para adquirir remédios e equipamentos? É claro que não! Esse dinheiro é desperdiçado com a manutenção da máquina burocrática: secretarias de saúde, cargos comissionados, reformas de prédios, campanhas de conscientização, dentre outros itens completamente inúteis. O que sobra, depois disso tudo, praticamente algumas migalhas, talvez chegue, de fato, aos hospitais.

O mesmo acontece com a educação: esqueça a grana gasta com escolas, professores e materiais didáticos. O grosso do dinheiro é gasto em secretarias, órgãos administrativos, cargos bem remunerados e financiamento de pesquisas irrelevantes. Não importa quantos por cento do PIB serão destinados a essa área: a maior parte disso vai se perder na burocracia - ou na corrupção mesmo. O resultado prático, fica apenas na teoria.

A verdade é que mais gasto público, como bem percebemos, não significa melhoria nos serviços - pelo contrário. Em primeiro lugar, existe o problema da ineficiência estatal, tão conhecido por nós, libertários. Como o estado e seus órgãos não têm concorrência, isso significa que eles não precisam mostrar serviço para serem economicamente viáveis. Além disso, não é preciso haver qualquer tipo de eficiência na gestão dos recursos; afinal de contas, o dinheiro não sai do bolso deles!

E em segundo lugar, há a questão dos incentivos perversos proporcionados pela máquina estatal. Em se tratando de órgãos públicos, quanto mais obsoleto, quanto mais sucateado, quanto mais ineficiente - em outras palavras, quanto pior - melhor. Áreas públicas problemáticas recebem mais recursos, enquanto que aquelas que resolvem os problemas tendem a ter seu orçamento limado, em favor daquelas com pior desempenho. Na máquina estatal, a coisa funciona de ponta-cabeça.

Ainda podemos mencionar, por fim, que o estado existe, basicamente, para criar privilégios. Em tese, a polícia foi criada para servir ao povo, garantindo segurança e paz pública. A verdade, porém, é que como qualquer outro segmento da máquina estatal, a polícia não serve ao povo - ela se serve dele. É por isso que vemos oficiais da segurança amazonense realizando, com a maior naturalidade, licitações para a aquisição de videogames de última geração e de poltronas massageadoras. Tudo isso, é claro, pago pelo contribuinte. Enquanto o cidadão amazonense, o segundo mais pobre do país, amarga com um alto índice de violência, a polícia de seu estado se preocupa com consoles de PlayStation 5.

Conforme citado, a licitação foi suspensa. Em nova nota, a secretaria de segurança do estado afirmou que vai consultar o Ministério da Justiça para formular um novo projeto e uma nova licitação. Esse caso, contudo, é apenas a exceção à regra - um projeto de privilégios às custas do pagador de impostos que acabou não indo para frente. A verdade é que, com ou sem PS5 para os policiais, o estado sempre foi e sempre será uma máquina de consumir recursos, desperdiçar dinheiro e conceder privilégios aos seus funcionários.

Referências:

https://g1.globo.com/am/amazonas/noticia/2023/10/31/secretaria-de-seguranca-do-amazonas-abre-licitacao-para-comprar-dezoito-playstation-5-para-servidores-publicos.ghtml

https://www.aleam.gov.br/amazonas-esta-no-podio-dos-estados-mais-violentos-do-brasil-e-deputado-wilker-cobra-planejamento-da-secretaria-de-seguranca/

https://www.poder360.com.br/brasil/secretaria-de-seguranca-do-am-cancela-compra-de-video-game/