O governo usou o caso do esquema criminoso do PCC como pretexto para sufocar fintechs e vigiar todas as transações digitais. A “maior operação da história” não derrotou o crime, mas garantiu ao Estado mais poder de vigilância.
A cena foi cinematográfica: dezenas de viaturas, agentes da Polícia Federal, helicópteros sobrevoando a Avenida Faria Lima, promotores do Ministério Público e fiscais da Receita em peso. O cenário, digno de filme policial, foi transmitido com cuidado pelos jornais: a chamada Operação Carbono Oculto, deflagrada em 28 de agosto e apresentada como a maior ofensiva contra o crime organizado no país. O alvo? Um suposto esquema de lavagem de dinheiro do PCC que teria movimentado mais de R$ 50 bilhões em apenas quatro anos, utilizando postos de combustíveis espalhados pelo Brasil e contas em fintechs instaladas no coração financeiro de São Paulo.
Era a história perfeita para unir espetáculo midiático e agenda política. Bastou a operação ser anunciada para a narrativa oficial dominar as manchetes: “o crime organizado usa bancos digitais para movimentar bilhões sem controle”. O enredo caiu como presente no colo do governo. Em poucas horas, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já anunciava uma nova regra da Receita Federal, obrigando fintechs a repassar informações de clientes como fazem os bancos tradicionais. Ou seja, em nome de combater o PCC, o Estado deu mais um passo no projeto que sempre esteve em andamento: vigiar todas as transações financeiras e ampliar sua capacidade de tributar.
Segundo as autoridades, a engenharia criminosa do PCC começava nas fazendas e postos de gasolina, passava por empresas de fachada e terminava em “contas-bolsão” abertas em fintechs. O charme da acusação estava em mostrar que os bancos digitais — justamente por serem mais acessíveis e menos burocráticos — serviam de canal para disfarçar bilhões, dificultando a rastreabilidade.
(Sugestão de Pausa)
Mas surge a contradição: se o Estado já sabia de tudo, por que esperou o escândalo explodir para agir? E se não sabia, isso não revela a completa ineficiência do aparato estatal de fiscalização, que já dispõe de ferramentas legais para investigar operações suspeitas? O governo transforma sua própria incapacidade em argumento político para sufocar ainda mais o setor privado.
O ministro Ricardo Lewandowski, hoje à frente da Justiça, celebrou a operação como “uma das maiores do mundo contra o crime organizado”. Mas a grandiosidade da frase esconde um detalhe incômodo: dos 14 alvos principais, apenas seis foram presos. Ou seja, o crime organizado segue ativo, adaptando-se e explorando novas brechas. Quem realmente saiu fortalecido foi o Estado, que aproveitou a ocasião para arrancar mais poder sobre quem nada tem a ver com o PCC: o cidadão comum que usa uma conta digital para pagar boletos ou receber clientes.
E essa não é a primeira vez que o governo tenta usar a retórica do crime para expandir sua vigilância. Em 1990, o governo Collor confiscou a poupança de milhões de brasileiros em nome da “estabilidade econômica”. O crime não estava nos cidadãos que guardavam seu dinheiro, mas no próprio Estado, que sequestrou a riqueza privada para tentar salvar sua máquina inflacionária. A lógica é idêntica: cria-se o inimigo invisível, vende-se a narrativa da urgência, e quem paga a conta é sempre o cidadão comum.
Mais recentemente, iniciou-se a guerra ao dinheiro vivo, ensaio perfeito para o modelo atual de vigilância. Primeiro, o Estado demonizou o uso de espécie, dizendo que só criminosos carregavam grandes quantias. Depois, incentivou a digitalização forçada das transações, com o PIX como ferramenta central. De solução moderna, o PIX rapidamente virou alvo de tentativas de monitoramento em massa, como o projeto de incluir todas as transações na plataforma e-Financeira.
No ano passado, a Receita tentou emplacar a proposta de que todas as transações via PIX fossem enviadas automaticamente à e-Financeira. A medida caiu após forte reação popular: ficou claro que quem seria monitorado não eram criminosos, mas trabalhadores informais, pequenos comerciantes e autônomos.
Agora a estratégia é outra: em vez de falar abertamente do PIX, o governo aproveita o escândalo do PCC para impor o mesmo cerco, só que via fintechs.
(Sugestão de Pausa)
O economista Rui São Pedro resumiu bem: “É cada vez mais Estado”. Na prática, a burocracia extra significa custos maiores para empresas, menos concorrência, serviços mais caros e, claro, mais dados à disposição da Receita Federal para tributar quem hoje sobrevive à margem do sistema formal.
Não é coincidência que a mudança tenha apoio entusiasmado dos grandes bancos. A Febraban e até organismos internacionais, como a OCDE, vinham pressionando o governo a enquadrar fintechs nas mesmas exigências dos gigantes do setor. O motivo é óbvio: quanto mais rígida a regulação, mais caro é operar uma fintech, menos concorrência sobrevive e mais clientes voltam para os bancos tradicionais, com suas tarifas abusivas e serviços engessados.
A regulação estatal não nasce da preocupação com justiça, mas do interesse em manter o oligopólio bancário e eliminar a concorrência. Quanto mais caro for operar uma fintech, menos empresas surgirão e mais clientes voltarão para os grandes bancos. Quem ganha são os tubarões do sistema; quem perde é o pequeno usuário que queria apenas uma conta simples sem tarifas exorbitantes.
É a velha estratégia do Estado: criar medo e depois vender uma suposta solução em forma de controle. A população assustada com o crime organizado aceita calada que suas liberdades financeiras sejam restringidas. O governo, que antes não conseguia aprovar regras para monitorar o PIX, agora encontra no caso do PCC o pretexto perfeito para retomar sua agenda de vigilância fiscal.
O detalhe mais perverso é que o verdadeiro beneficiário da medida não é o cidadão, mas quem opera à margem. O PCC continuará atuando, pois organizações criminosas sempre encontram meios de contornar a lei. O impacto real recairá sobre a população comum, que verá sua vida financeira permanentemente rastreada.
(Sugestão de Pausa)
Do ponto de vista libertário, o espetáculo reafirma duas coisas: o Estado é ineficiente para combater o crime, mas extremamente eficaz em usar o crime como desculpa para controlar inocentes. As fintechs surgiram como resposta às barreiras criadas pelo próprio Estado — contas digitais, baratas e acessíveis nasceram porque o sistema bancário tradicional, protegido por regulação e cartéis, sempre foi fechado e hostil ao consumidor comum. Agora, esse mesmo Estado sufoca a inovação sob o pretexto de que ela teria sido usada por criminosos. É como culpar a rodovia por um assalto e, em vez de prender os bandidos, aumentar o pedágio para todos que passam por ela.
Além disso, o PCC não existe no vácuo. Ele prospera porque há um mercado negro bilionário criado artificialmente por políticas estatais, em especial pela guerra às drogas. Enquanto o governo insiste em manter a proibição, alimenta indiretamente o poder financeiro das facções. É uma engrenagem perfeita: o Estado cria um mercado ilegal, as facções o dominam, e depois o próprio Estado usa esse fato para justificar mais vigilância e mais tributos.
E essa engrenagem perversa não é exclusividade do Brasil. Nos Estados Unidos, após os atentados de 11 de setembro, criou-se o Patriot Act em nome da “segurança nacional”. O resultado: vigilância em massa, monitoramento de transações financeiras, restrição de privacidade. Duas décadas depois, o terrorismo não desapareceu, mas o poder do Estado sobre os cidadãos comuns cresceu exponencialmente. A lógica é sempre a mesma: problema, reação, solução. O problema é real, a reação popular é emocional, e a solução proposta é sempre o avanço do Leviatã.
A conclusão é que, no fim, o verdadeiro “crime organizado” não é apenas o PCC, mas o próprio Estado, que funciona como uma máfia legalizada. A diferença é que a máfia tradicional extorque e controla territórios na ilegalidade, enquanto a máfia estatal se esconde atrás de decretos, portarias e operações midiáticas. O mecanismo é o mesmo: usar a violência para controlar inocentes e manter privilégios.
(Sugestão de Pausa)
Enquanto ministros posam para fotos, a imprensa aplaude e os bancos tradicionais sorriem, a realidade é outra: o crime organizado não foi derrotado, a Receita ganhou mais poder e o cidadão perdeu mais um pouco de sua liberdade. Esse é o balanço real da operação. O governo não combate o crime — apenas transforma todos nós em suspeitos em potencial.
O padrão é claro: cada etapa é apresentada como modernização ou segurança, mas o objetivo verdadeiro é tornar o cidadão totalmente rastreável. Do confisco de Collor à “guerra ao dinheiro vivo”, passando pelo PIX e chegando agora às fintechs, a trajetória mostra que não se trata de medidas isoladas, mas de um plano contínuo de expansão do controle estatal sobre a vida financeira das pessoas.
Por isso, tire seu dinheiro das mãos do Estado, compre Bitcoin, torne seu patrimônio inconfiscável. Assim, você protege sua família e impede que o Leviatã estatal use seus recursos contra você. Afinal, cada real de imposto pago hoje será certamente reinvestido em mais perseguição e controle amanhã.
https://www.gazetadopovo.com.br/republica/governo-politiza-operacao-da-pf-contra-o-pcc-para-regular-fintechs/
https://olhardigital.com.br/2025/08/29/pro/do-campo-as-fintechs-o-caminho-do-dinheiro-no-esquema-do-pcc/